1.2.06

Movimento Fust Já! (Entrevista com Rodrigo Baggio, do CDI)

A REDE - 31/01/2006
O Comitê para a Democratização da Informática (CDI) lançou, no dia 2 de dezembro, a campanha Fust Já!, para pressionar o Ministério das Comunicações a tomar providências imediatas para a liberação dos recursos do Fust. Até o dia 7 de janeiro, 2.040 pessoas haviam entrado no site da campanha www.fustja.org.br e enviado sua reivindicação. A liberação de parte dos recursos, no entanto, é decisão já tomada pelo ministério. Desde o início de outubro, o ministro Hélio Costa afirma, em declarações públicas, seu empenho para aplicar em telefonia rural o dinheiro a ser arrecadado em 2006. Se a campanha não teve influência direta nessa decisão, pode ter o mérito de ampliar a discussão sobre o destino do dinheiro recolhido ao fundo desde agosto de 2000; demandar transparência em sua gestão e a destinação de recursos para projetos de inclusão digital. A rede CDI, onde surgiu a idéia de lançar a campanha Fust Já, tem comitês regionais em 30 cidades e é formada por cerca de mil Escolas de Informática e Cidadania. Sua proposta é realizar, até março, uma oficina envolvendo entidades que atuam com tecnologia da informação e comunicação para inclusão, a fim de elaborar um programa mínimo e ampliar a ação. Essa articulação será imprescindível para que a campanha se torne conseqüente, porque há empecilhos, na própria lei que criou o fundo, ao direcionamento dos recursos a entidades do Terceiro Setor ou ao provimento de conexões em banda larga.
Rodrigo Baggio, diretor-executivo da rede CDI, acredita no potencial da internet para disseminar a idéia, e trabalha, como revela nesta entrevista, para que a campanha se torne uma frente da sociedade civil.
Rede – O que é a campanha Fust Já?
Rodrigo Baggio – É uma frente de entidades que querem a liberação imediata dos recursos do Fust. No CDI, nós trabalhamos muito com a pedagogia de Paulo Freire e ele fala muito na pedagogia da indignação, em como é importante a gente exercer essa indignação cidadã. E isso surgiu no último encontro da rede CDI, em novembro, onde estavam 200 lideranças da rede, que decidiram buscar mais informação sobre a questão do Fust. As operadoras recolhem o equivalente a 1% das contas telefônicas, há cinco anos, para o Fust, que deveria ser o fundo da inclusão digital, deveria ser um exemplo de boa prática na área de inclusão digital para a América Latina. O conceito de universalização das telecomunicações, de beneficiar hospitais, bibliotecas, escolas públicas, projetos de inclusão digital é uma grande idéia. Só que o Fust vira uma frustração, porque o fundo nunca foi utilizado. Nem se sabe exatamente quanto de recursos há no fundo. Fala-se em R$ 4 bilhões, R$ 5 bilhões, já ouvi falar em até em R$ 6 bilhões contingenciados. Essa é uma das questões que a Frente Fust Já! levanta. O cidadão brasileiro tem direito de saber quanto afinal nós temos no Fust.
ARede – Quem participa da campanha?
Baggio – Solicitar a liberação do Fust, na verdade, não é uma idéia nova. A gente já vê organizações como a Sucesu, a Rits e o próprio CDI buscarem, nesses cinco anos, saber o que acontece com esses recursos. Esse é um assunto tão importante e estratégico para o desenvolvimento social e econômico do Brasil, que precisamos articular uma série de organizações da sociedade com o objetivo de buscar a liberação. Depois da reunião do CDI, contatei, no Rio de Janeiro, duas redes de empreendedores sociais, a Ashoka e a Avina. Essas organizações apoiaram imediatamente a Frente Fust Já!. No Canadá, o Marcelo Fernandes, coordenador do CDI Pernambuco, líder Avina e da Fundação Kellog e representante da rede CDI no Comitê Gestor da Internet, articulou a adesão imediata da Rits, por meio do Carlos Afonso, e do movimento nacional de software livre, por meio do Mario Teza – que estavam em uma reunião de governança na internet, depois da Cúpula Mundial de Túnis. A Addcomm, empresa de marketing na internet, fez voluntariamente o site da campanha. Fizemos o lançamento dentro de uma visão inovadora, no que consiste o Terceiro Setor se apropriar da internet como uma ferramenta de mobilização social. A gente utiliza o conceito de passeata virtual, na medida em que, dentro do site, do portal, cada pessoa pode enviar um e-mail para o ministro Hélio Costa pedindo a liberação imediata dos recursos. A primeira ação é essa passeata virtual. A segunda é indicar essa ação para um amigo ou série de amigos, criando o efeito da disseminação, do contágio, de um vírus do bem. As pessoas também podem botar um banner da campanha em seu site. Com o lançamento, dia 2 de dezembro, recebemos outros apoios da Fase, da Sucesu, do Viva Rio, da Assespro e do Coletivo Digital.
ARede – Como poderá ser usado esse dinheiro?
Baggio – A visão da rede CDI é que o poder público não precisa reinventar a roda na área de inclusão digital. No Brasil, temos projetos de inclusão digital com bastante qualidade, já testados, em pequena, média e larga escala, de diversas ONGs, empresas e organizações. Para a gente transformar isso em uma política pública e aumentar a escala, faltam recursos financeiros. Recentemente, foi feita, pelo Comitê Gestor da Internet, uma grande pesquisa em que se perguntou a milhares de brasileiros se eles acessam a internet de telecentros públicos e gratuitos. O percentual foi de 0,47%. O desafio é sempre o recurso financeiro para a expansão e o aumento da qualidade desses projetos. A Frente Fust Já! propõe que, a exemplo de outros fundos públicos, se crie um conselho composto pela sociedade civil organizada, pelo setor privado e pelo governo, para planejamento, gestão e execução dos recursos do Fust. Precisamos agregar valor nesse processo e garantir o compromisso com o planejamento e a implantação eficiente desse projeto. É uma visão de longo prazo. É possível fazer um grande plano com qualidade e acompanhar sua execução durante anos. Nós discutimos também estratégias de como continuar, a partir deste primeiro trimestre, a mobilização da sociedade civil organizada. O plano é a articulação de uma oficina com as principais organizações que atuam com a causa da inclusão digital -- não necessariamente focadas 100% em inclusão digital, várias organizações têm outro foco e se utilizam de tecnologia – para, nesse workshop, definir idéias, conceitos mínimos, comuns, para pautar nossa atuação. Queremos fazer a oficina em fevereiro ou março. E ampliar a frente, que cria um novo paradigma em termos de organização de movimentos sociais se utilizando da internet no Brasil. Estamos aprendendo, fazendo uma frente em que você pode ter um pool de insituições da sociedade civil usando a internet como uma forma de disseminação e contágio. Esse é um dado interessante, novo, que pode criar um novo paradigma no setor da cidadania.
ARede – Mas a internet brasileira ainda é elitizada, não tem a amplitude que vocês pretendem para a campanha.
Baggio – Nós poderíamos brincar com isso, dizendo que gostaríamos de mobilizar os 12% de brasileiros que são internautas, em prol da conexão dos outros 88%; e estamos fazendo uma diferença. Mas os telecentros, infocentros e escolas, os projetos de inclusão digital, são fundamentais nessa mobilização. São esses projetos que capilarizam e mobilizam a comunidade para participar. São eles que vão ampliar, dar base à campanha.

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