23.9.05

Todos contra todos

Especial: Telecomunicações / EXAME - 28/09/2005
Empresas de TV paga vendem telefone, e telefônicas vendem TV paga - a guerra dos cabos começouUm custo estimado de 4 Bilhões de dólares, a operadora fixa americana SBC lançou o projeto Lightspeed. A idéia é transformar a tradicional companhia telefônica num novo tipo de empresa de telecomunicações, capaz de oferecer, além das chamadas de voz, serviços de internet e TV paga. O movimento é bastante compreensível. Concorrentes das telefônicas aparecem de todos os lados. O Google já oferece um serviço de voz pela Internet, a Microsoft deve fazê-lo em breve, e o site de leilões eBay pagou 2,6 bilhões de dólares pela Skype, maior empresa de telefonia pela rede do mundo. Mas a maior competição vem das próprias TVs a cabo.
Com pacotes de vídeo, Internet de alta velocidade e telefonia IP - tudo cobrado em uma única conta, na estratégia que ficou conhecida como triple play -, as empresas de TV paga deixaram as telefônicas americanas acuadas. A guerra dos cabos começou.Esse novo cenário de competição ainda é muito incipiente. Só em mercados mais desenvolvidos, como nos Estados Unidos e em alguns países europeus e asiáticos, a concorrência direta entre telefônicas e operadoras de TV começa a tomar forma. Mas não existem mais dúvidas de que, graças à tecnologia da Internet, todos os serviços de comunicação podem ser oferecidos numa única infra-estrutura física.
Não é necessário ter uma rede de circuitos comutados para oferecer telefonia nem uma rede de cabos para vender televisão por assinatura. O plano da SBC é permitir que seus fios de cobre sejam capazes de trafegar dados a uma velocidade altíssima, muito superior às atuais conexões de banda larga, para oferecer o que já se chama de IPTV, ou televisão por meio do protocolo de internet. A transição apresenta um desafio técnico importante.
Como a SBC, a Verizon, outra operadora americana, também está implantando novas redes de fibra óptica. No Reino Unido, a British Telecom está melhorando a qualidade dos fios de cobre. Ainda há duvidas sobre a capacidade de transmissão de dados nessas linhas.Mesmo que todos os obstáculos técnicos sejam superados, há outras questões igualmente importantes a resolver. Em primeiro lugar, as companhias telefôpnicas precisam obter permissão das autoridades reguladoras para oferecer vídeo. Depois, precisam negociar a programação de TVs e filmes com emissoras e estúdios, que, em muitos casos, têm relações próximas com os distribuidores de TV por assinatura.
As telefõnicas também terão de aprender a empacotar e a vender vídeo, algo que suas concorrentes do cabo fazem desde o primeiro dia de vida. Por fim, há o risco de que os clientes simplesmente usem as conexões de ótima qualidade para fazer seus telefonemas pela internet - com o Skype, por exemplo - ou para receber conteúdo disponível gratuitamente em sites da Internet ou em redes de compartilhamento de arquivos.No Brasil, a nova competição ainda vai demorar para ter o mesmo impacto. Enquanto nos Estados Unidos as TVs a cabo tem 80% dos assinantes de internet de banda larga, aqui as telefônicas predominam. Além disso, a base de assinantes de TV a cabo no país é muito pequena - cerca de 3,8 milhões de pessoas - e as redes de satélite não tem condições de oferecer acesso à internet. "Hoje, para as empresas de TV paga, a voz sobre IP é mais uma arma para atrair clientes". diz Virgílio Amaral, diretor de tecnologia da TVA, empresa do Grupo Abril, que edita EXAME. O TVA Voz, serviço de telefonia IP lançado em junho, conta com menos de 1000 clientes.
A NET, maior empresa de TV a cabo do país que tem entre seus sócios a mexicana Telmex, ainda não tem planos para o lançamento de seu serviço de telefonia. As telefônicas também estão em compasso de espera, mas já fazem seus preparativos.
A Telemar tem 40 funcionários no Rio de Janeiro, mais meia dúzia em Belo Horizonte, participando de uma experiência piloto. A empresa negocia acordos com provedores de conteúdo para TV e estuda a estratégia de lançamento do serviço. "Queremos ampliar o mercado de TV paga do Brasil, que não cresce há dez anos. Acreditamos que não é por falta de demanda", diz Gilberto Sotto Maior Junior, gerente de novos produtos da Telemar. Na Telefônica, os testes devem começar ainda neste ano e já há conversas com estúdios de Hollywood para montar o catálogo de filmes que possam ser vendidos sob demanda.
A empresa poderá aproveitar a experiência técnica da matriz, na Espanha, que oferece IPTV desde o ano passado. Mas lá os números ainda são modestos: apenas 50 000 assinantes para os serviços de vídeo. "Praticamente toda a população espanhola tem TV paga, então a concorrência é bem maior", diz Márcio Fabri, diretor de novos negócios da Telefônica.Outro desafio será a questão regulatória. A Anatel não se pronuncia oficialmente sobre o assunto e ainda não foi consultada sobre nenhum caso concreto. Os operadores de telefonia fixa afirmam que já estão autorizados a oferecer o serviço de TV por uma licença de comunicação multimídia concedida pela Anatel. Os limites dessa autorização, no entanto, não estão bem delimitados. Enquanto as telefônicas dizem que podem fornecer o serviço, pois estão apenas transrnitindo conteúdo, as TVs pagas temem uma invasão no seu mercado consumidor. "É certo que haverá ainda muita discussão sobre o assunto", diz Marcela Wasman Ejnisman, advogada especialista em telecomunicações.

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