5.6.07

Indústria de Telecom vai começar a demitir

Convergência Digital

O 51º painel Telebrasil, evento que reuniu os principais executivos de telecomunicações na Costa do Sauípe, Salvador, concentrou suas atenções nas movimentações das operadoras por um novo cenário no país e nos embates mercadológicos com a radiodifusão mas, mesmo que como pano de fundo, expôs um cenário não muito favorável para um dos pilares do setor: o da indústria. Boa parte dos fabricantes presentes ao encontro admitiu que o limite chegou.

Os primeiros cinco meses do ano ficaram muito abaixo da expectativa, do ponto de vista de aquisições. Apesar de cautelosos, muitos já admitem que as demissões serão inevitáveis, uma vez que não há mais, segundo eles, onde cortar custos para sustentar os parques fabris no país. Os meses de abril e maio não trouxeram nenhuma mudança em relação ao primeiro semestre do ano, considerado o pior do setor nos últimos tempos.

Isso porque o 'congelamento' de pedidos das operadoras permaneceu, uma vez que elas continuam à espera das novas licenças, além de acordos com o governo para realizarem um novo ciclo de investimentos. No momento, afirmam os fabricantes, os aportes das teles acontecem tão somente na manutenção e suporte das atuais operações.

Soma-se ao momento das operadoras, o problema do câmbio. Se o presidente Lula conclamou os empresários brasileiros a lutarem contra a China, no setor de telecom, esse alerta se mostra inviável com o real tão em baixa. As indústrias brasileiras, afirmam os executivos, estão levando uma 'goleada' das unidades fabris de suas próprias empresas instaladas na China. Neste embate, os contratos globais ficam com os chineses.

"Já tinha reduzido bastante a minha produção no Brasil. Mas, com o câmbio abaixo de R$ 1,90, fico totalmente sem condições de tentar competir com a fábrica da Alcatel-Lucent instalada na China. Eles levam todos os contratos. Não há como competir internamente", reclamou o presidente da Alcatel-Lucent, Jônio Foigel.

Goleada chinesa

O vice-presidente comercial da Ericsson, Carlos Duprat, que há muito diz que a desindustrialização do setor é um risco de curto prazo, diz que o câmbio abaixo de R$ 1,90 é um 'desastre' para as fábricas multinacionais instaladas no país. "Muitos se esquecem que somos responsáveis pela geração de empregos no país. E contratamos muitos brasileiros, que estão no chão de fábrica", diz Duprat.

"Mas se não temos demanda interna e não há como competirmos com as unidades no exterior, simplesmente não temos como manter o parque fabril. Temos um negócio que precisa se sustentar. Fechar uma fábrica em silêncio é fácil. Reabri-la é que é a tarefa mais complexa", adverte o executivo da Ericsson, que fechou o último grande contrato de expansão de rede - a da infra-estrutura GSM da Vivo.

"Estou perdendo contratos para a RFS da China, e até para a RFS do México", declarou Luiz Antonio Oliveira, presidente da RFS Telecomunicações para a região da América Latina, fabricante de antenas para o setor. No Brasil, a empresa emprega entre funcionários diretos e indiretos, cerca de 600 pessoas. Uma linha fabril já foi perdida para o México: a de antenas de grande porte para operações WiMAX.

"Fui obrigado a fazer essa opção. É mais barato para a RFS produzir no México do que aqui no Brasil. Cheguei no meu limite. Montei um parque no país para ser uma operação global. Mas, infelizmente, estou com sérias dificuldades para manter a sua operação", declarou Oliveira, reiterando o posicionamento dos demais fabricantes. Com relação à China, a situação é ainda mais grave.

"Não adianta para nós, executivos, ficarmos falando que a situação dos empregados na China é isso ou aquilo. O Brasil sofre com carga tributária, com mão-de-obra mais cara e com o câmbio extremamente desfavorável. As exportações, que eram uma saída, estão cada vez mais impraticáveis, inclusive para o próprio Mercosul", completou Oliveira.

O presidente da Nokia Siemens Networks, Aluísio Byrro, foi outro executivo a revelar sua preocupação com o momento nacional. A empresa, que está estruturando sua operação após a megafusão, mostra-se temorosa com os rumos da economia brasileira em relação ao setor de telecom.

"Falar que os empresários precisam se adaptar aos tempos e dizer que o câmbio não é uma questão que nos causa problemas é ter uma visão limitada das ações empresariais. O Brasil quer investir em hardware sendo muito mais caro que qualquer outra unidade instalada em um país emergente?", questionou Byrro.

Diretor de telecomunicações da Abinee e presidente da Nec do Brasil - fabricante que suspendeu toda a produção local no país, Paulo Castelo Branco, não escondeu a sua decepção com o governo Lula, que endossou, passando por cima de um acordo fechado no Congresso Nacional, uma posição unilateral da Receita Federal, contra a inclusão do setor nos benefícios da Lei da Inovação.

"Eles não mudam a situação atual do setor, mas nos ajudariam a suportar um pouco mais a questão do câmbio. É uma situação surreal impedir que tenhamos acessos aos recursos da Lei de Inovação porque temos os benefícios da Lei de Informática", declarou o executivo.

"O setor de Telecom ficou fora do Programa de Aceleração do Crescimento. Também não teve nenhuma MP do Bem, para dar um alento ao setor. A Lei de Inovação seria esse plus favorável e com um diferencial: ele impõe recursos para o software, que é o onde o Brasil precisa e deve apostar. Mas, ao que parece, não é essa a política do governo", conclui Castelo Branco.

Apesar do momento crítico, os fornecedores ainda mantêm a esperança de recuperar o ano de 2007, se de fato, houver um acordo entre governo e operadoras para a informatização das escolas e a adoção de uma Parceria Pública Privada para o suporte de um Plano Nacinal de Banda Larga. Também esperam que a Anatel consiga, como prometido pelo conselheiro José Leite, presente ao evento, destravar os leilões da Terceira Geração e do WiMAX.

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