9.9.05

A briga que paralisa a Brasil Telecom

EXAME - 14/09/2005

Com clima de incerteza e projetos na gaveta. A operadora é o exemplo do que uma disputa entre sócios pode provocarEm agosto, o executivo carioca Ricardo Knoepfelmacher aproveitou as férias para visitar o litoral da Normandia, no norte da França. Sua atenção estava voltada para uma praia em especial: Omaha, a mesma onde os soldados aliados desembarcado naquele que ficou conhecido como Dia D, um grande marco da Segunda Guerra Mundial. Daquela praia, Knoepfelmacher trouxe um punhado de areia – hoje guardada como um talismã em seu escritório. Omaha foi o nome escolhido pelo Citibank e pelos fundos de pensão (Previ e Petros, entre outros) para batizar o projeto que prevê a tomada de controle na Brasil Telecom (BrT), operadora de telefonia da qual são sócios também o Banco Opportunity, do baiano Daniel Dantas, e a Telecom Itália. Knoepfelmacher é o encarregado de comandar essa “invasão” e tentar colocar um ponto final numa disputa que já dura quase cinco anos. Nos últimos meses, essa briga atingiu seu ponto mais crítico, levando a empresa a certa paralisia. “Todo dia sai gente boa daqui. São especialistas, gerentes, gente preparada que acabou se cansando de viver na indefinição”, afirma um alto executivo da operadora. “Estamos tocando o dia-a-dia como podemos, mas os grandes projetos estão parados.”No final de agosto, após longas batalhas judiciais, o Citibank e os fundos de pensão conseguiram assumir o controle da Brasil Telecom Participações, holding que controla a operadora. Com essa manobra, o Opportunity foi afastado da holding. No entanto, a presidência da operadora de telefonia ainda está nas mãos do banco – representado na Brasil Telecom pela italiana Carla Cico. A situação resultante é, no mínimo, curiosa. Numa espécie de bunker improvisado no subsolo da sede da empresa, em Brasília, Knoepfelmacher, ex-sócio da administradora de recursos Angra Partners, responsável pela gestão dos investimentos do Citi e dos fundos na BrT, dá expediente como presidente da holding. Enquanto isso, no segundo andar do prédio, Carla Cico continua despachando como presidente da operadora. Esse “comando duplo”começa a alterar até mesmo as regras de funcionamento do edifício. Maratonista nas horas vagas, Carla há anos havia mandado desligar dois dos três elevadores da empresa. Para circular pelos cinco andares da sede, os funcionários só podiam contar com escadas e rampas. Desde que os representantes do outro bloco de acionistas chegaram, os elevadores voltaram a funcionar normalmente. Os inimigos devem dividir o mesmo teto – e os elevadores – pelo mesmo até a metade de setembro, quando, segundo a expectativa de Knoepfelmacher, a holding terá conseguido cumprir as etapas legais para assumir a presidência da Brasil Telecom. “Queremos fazer a transição da maneira mais tranquila possível”, diz ele.
O desafio de quem permanecer no comando será tirar a empresa de um estado de apatia que tende a comprometer os resultados mais cedo ou mais tarde. “Há tempos ninguém mais faz planejamento estratégico”, afirma um ex-gerente que deixou a BrT semanas atrás. Sem saber quais os planos da empresa e quem, de fato, vai comandá-la, os executivos preferem não autorizar investimentos nem assumir riscos. O excesso de cautela acabou levando planos para a geladeira. Um exemplo é o projeto de aparelhos híbridos, que permitiriam ao usuário fazer ligações do celular usando a rede fixa – até há pouco tempo, a BrT era vista no mercado como líder na integração entre as operadoras de telefonia fixa e celular. Anunciado no início do ano com previsão de lançamento em agosto, o projeto não saiu do papel. “Deixar de lado os investimentos em tecnologia pode ser um problema no futuro”, afirma um analista do setor.A incerteza em relação aos executivos que devem permanecer na empresa só faz agravar a situação. Nos últimos dias, Knoepfelmacher conversou com a maioria dos que ocupam cargos de liderança. Por enquanto, apenas um deles deve permanecer caso o Opportunity seja definitivamente afastado. Trata-se do diretor técnico Francisco Santiago, que está na companhia desde a privatização. Duas empresas de recrutamento – Heidrick & Struggles e SpencerStuart – forma escolhidas para contratar mais de uma dezena de altos executivos. O próprio Knoepfelmacher deverá ocupar o cargo que hoje pertence a Carla Cico. Os outros dois nomes já definidos são Luiz Francisco Perrone, ex-conselheiro da Anatel, para a vice-presidência de assuntos estratégicos e regulatórios, e Charles Putz, para a diretoria financeira. Muitos cargos devem desaparecer. Dos 16 postos ligados diretamente à presidência, devem restar apenas seis. Apesar de já estar em andamento, o projeto do Citi e dos fundos ainda corre o risco de atrasar. “Não descartamos a possibilidade de o Opportunity tentar barrar nosso avanço”, afirma um representante dos acionistas.

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