6.6.06

Bloqueio de celulares: um fiasco do setor de telecom

Os ataques que aterrorizaram a população de São Paulo ao longo do mês de maio serviram para comprovar o quanto o ministério das Comunicações e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) estão fora de sintonia na hora de estabelecer regras claras para o setor e decidir questões estratégicas.A questão do bloqueio de celulares dentro dos presídios vem sendo debatida pela Anatel desde 2002, quando a agência colocou em consulta pública uma proposta para que a suspensão dos serviços não saísse, em nenhum metro, da área interna dessas entidades. Em setembro de 2002, quando foi aprovada a norma para uso do Bloqueador de Sinais de Radiocomunicações (BSR), alguns Estados decidiram adotar a medida. No total, 15 penitenciárias em todo o País, localizadas no Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia, contavam com um sistema de bloqueio.
No entanto, como a manutenção e desses aparelhos eram de responsabilidade das administrações penitenciárias, em pouco tempo as soluções se tornaram obsoletas e nunca foram atualizadas. O esquema de fiscalização, por sua vez, que poderia dar o alerta de que as soluções adotadas não estavam funcionando conforme o esperado, não ficou sob responsabilidade das operadoras de cada região e muito menos da Anatel.
Quando pressionada pelos órgãos públicos de segurança durante a onda de ataques em São Paulo, a agência se apressou em confirmar a isenção de responsabilidade das operadoras e principalmente a sua, no funcionamento correto dos bloqueios. O próprio ministro das Comunicações, Hélio Costa, afirmou que a aquisição e instalação de sistemas bloqueadores de celulares não eram de competência da Anatel ou de qualquer outro órgão do governo federal, nem das prestadoras de serviço móvel. A responsabilidade, segundo ele, era dos governos estaduais.
Em nenhum momento o ministério ou a agência sinalizaram de forma pró-ativa a intenção de ajudar as autoridades a resolver a questão. A posição só veio depois que o ministério da Justiça defendeu a criação de um projeto de lei que obrigue as operadoras de celular a responder pelo bloqueio do sinal nas penitenciárias.
Dessa forma, apenas dois dias depois de enfatizar que o bloqueio não era responsabilidade do setor, o ministro das Comunicações voltou atrás e afirmou que seu ministério, em conjunto com o da Justiça, preparavam um procedimento administrativo para obrigar as operadoras a interromper seus sinais nos presídios. "Quem emite, é obrigado a conter as suas emissões, principalmente dentro das penitenciárias. É possível ao governo, por procedimento administrativo, impor às operadoras o serviço de bloqueio. Na radiodifusão, cabe ao emissor a preocupação de não deixar que suas ondas cheguem a lugares que não são desejáveis. Isso se aplica também à questão da telefonia. Se o telefone está entrando em áreas que não deveria entrar, evidentemente o cuidado tem que ser da própria companhia", contrapôs Costa.
Assim, em 18 de maio, durante entrevista coletiva ao lado do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, Hélio Costa reiterou a decisão da Anatel, salientando que as concessionárias e operadoras de telefonia celular demonstraram intenção de cooperar. "Os representantes das concessionárias disseram não estar preocupados com quanto vai custar ou quem vai pagar — eles assumiram a responsabilidade de resolver a crise", disse.Na mesma ocasião, o ministro da Justiça informou sobre a elaboração conjunta de um instrumento normativo para determinar de que forma seria feito o bloqueio. "As empresas que se colocaram plena-mente solidárias e dispostas a fazer o necessário para prestar esse serviço público, deverão encontrar os meios tecnológicos e operacionalizá-lo", acrescentou Bastos.
Diante desse cenário, ficam cada vez mais claras as razões pelas quais o setor de telecomunicações ainda possui questões chave em aberto. A dificuldade em tomar posições e definir regras claras para esse mercado por parte da Anatel e do próprio ministério das Comunicações, resulta em atraso tecnológico, prejuízo financeiro para os usuários e em situações drásticas como a onda de violência que assolou São Paulo, em brechas de segurança que podem custar a vida de centenas de cidadãos.E é até esse ponto que a postura — ou a hesitação e a lentidão - de um órgão público pode refletir no dia-a-dia dos brasileiros comuns. Não resta dúvidas de que passou a hora desse comportamento mudar.

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