30.6.08

Comentários à audiência pública sobre mudanças no marco regulatório


CONVERGÊNCIA DIGITAL

Declarações capazes de colocar ainda mais lenha na fogueira que arde entre os setores de Radiodifusão e Telecomunicações. O Superintendente de Serviços Privados da Anatel, Jarbas Valente, reafirmou nesta sexta-feira (27/06), que o órgão regulador admite a hipótese de vir a usar frequências que ficarão ociosas na radiodifusão após a digitalização das redes de TVs, para a prestação de outros serviços, não necessariamente, ligados à área.

Segundo ele, o espectro poderá ser utilizado para a oferta de serviços típicos de TV por Assinatura, como por exemplo, o envio de pacotes de "filmes on demand" para usuários ou para a transmissão de dados. Isso porque, avalia Valente, as empresas de radiodifusão, com a digitalização de suas redes terão "sobra de banda" para ampliar o portfólio de serviços.

No uso desse 'espectro de sobra', observou Valente, existe também a possibilidade da prestação de outros serviços interativos aos usuários não necessariamente previstos pela TV Digital. Entram nesta seara, os produtos de Telecomunicações. Se tal ocorrer, destaca o superintendente de Serviços Privados da Anatel, os radiodifusores terão que pedir à Agência, outorgas para prestação de serviços de Telecom ou de Comunicação Multimídia.

Se este cenário vier a se concretizar evidencia-se a disputa entre os players tradicionais e os da radiodifusão na era do chamado 'quad play' - voz fixa, móvel, TV e Internet Banda larga. Nos Estados Unidos, por exemplo, já foram desenvolvidos aplicativos que permitem o uso dessa faixa ociosa para a transmissão desses pacotes de dados e imagens, denominado naquele mercado como "carrossel".

Sem definição

"O usuário pode receber em sua casa toda a programação das grandes redes de TV por Assinatura e escolher aquilo que deseja assistir", explicou Valente. Segundo ele, basta que o usuário compre o pacote para a sua TV Digital e armazene a programação em seu disco rígido.

A resposta do Superintendente foi dada à uma indagação feita por técnicos da Abert, que participaram da primeira audiência pública que o órgão regulador realizou nesta sexta-feira (2706), em Brasília, para explicar as mudanças nos marcos regulatórios do setor de Telecomunicações.

A posição de Valente é importante no atual momento. A Anatel estuda, por exemplo, como inserir mobilidade para o edital de 3,5GHz e também o que fazer com a faixa de 2,5GHz, aqui, utilizada pelas operadoras de MMDS (TV por microondas) e cujas licenças começam a ser renovadas - ou não, conforme vontade da Anatel - em janeiro de 2009.

O embate é grande nesta área. As operadoras MMDS deixam claro que querem espectro para usar WiMAX e entrar na briga da telefonia e da banda larga. Já as concessionárias e operadoras móveis querem espaço em 3,5GHz e pleiteiam mais 'espectro', para que possam assegurar qualidade de serviço de última geração para o consumidor brasileiro.

Prorrogação

Estão em consulta pública até o próximo dia 17 de julho, as alterações no "Plano Geral de Outorgas (PGO)", nos serviços de telecomunicações prestados no regime público e a proposta de "Plano Geral de Atualização da Regulamentação das Telecomunicações no Brasil (PGR)".

Jarbas Valente assumiu que se dependesse "do corpo técnico" da Anatel, as duas consultas públicas teriam seus prazos dilatados por pelo menos 60 dias. Mas lembrou que tal decisão terá de partir do Conselho Diretor da Anatel. Um pedido neste sentido, feito pelo Conselho Consultivo do órgão regulador e outros dois de entidades que representariam os interesses das empresas do setor, já estão, inclusive, à mesa dos conselheiros da Anatel.

Antecipação de regras

Durante a audiência pública, Luís Henrique Barbosa Silva, representante da Telcomp - Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços Competitivos - pediu que a Anatel antecipe algumas metas do PGO, antes de iniciar o processo de mudanças nos marcos regulatórios com o PGR.

Dentre as medidas solicitadas pela entidade, destaca-se a separação contábil dos serviços de telefonia fixa dos Serviços de Comunicação Multimídia. Para a Telcomp, a medida daria condições aos pequenos prestadores de SCM de requererem a isonomia de tratamento na compra de infra-estrutura para Internet banda larga para o órgão regulador.

Casuísmos

Valente também aproveitou para rechaçar as acusações de que a Anatel estaria trabalhando sob encomenda do governo para mudar os marcos regulatórios, no sentido de facilitar novas fusões,como por exemplo, a da Oi/Brasil Telecom. "Não há nada de casuístico nisso", disse o Superintendente de Serviços Privados, que inclusive esteve no Ministério Público Federal para debater as propostas de mudanças no setor.

Segundo Jarbas Valente, após a entrada do Embaixador Ronaldo Sardenberg para a presidência do Conselho Diretor da Anatel, esse trabalho de revisão dos marcos regulatórios passou a ser "sistematizado" com o foco na convergência tecnológica, prioridade do Embaixador, em função das diversas possibilidade de serviços que podem ser criados e ofertados a partir do mundo IP.

Amarras ao investimento

O ex-superintendente de Serviços Privados e também de Universalização da Anatel, Edmundo Matarazzo, atualmente atuando no setor como consultor com a empresa Matarazzo & Associados, ao participar da Audiência Pública - que reuniu pouco mais de 100 pessoas - disse que o maior problema criado pela Agência ao anunciar suas metas de revisão, foi estipular prazos para o cumprimento da tarefa.

"O investidor que está com a caneta na mão não vai assinar nada, se não tiver plena consciêcia e segurança jurídica, sobre as regras do mercado", destacou. Matarazzo também está preocupado com o carga de regulamentação que a Anatel pretende criar num setor, no qual a tendência mundial tem sido, justamente, evitar o máximo possível as amarras jurídicas, de forma a permitir que grandes corporações possam competir livremente no mercado.

"O sujeito está pedindo para dar um mergulho no mar e a Anatel coloca nele um escafandro de chumbo, pesado, como é que ele vai se movimentar? E aí ele vem e diz: Mas eu só queria nadar e nem sei se vou muito fundo", explicou o consultor, sobre como está assistindo as reações no mercado de Telecomunicações. Matarazzo lembra que o serviço móvel no Brasil explodiu - são mais de 130 milhões de usuários - justamente pela falta de regulamentações excessivas.

Ele também vê uma contradição no mercado com relação à discussão da fusão da Brasil Telecom e da Oi. Ao mesmo tempo em que o governo pensa em criar um grande conglomerado brasileiro de telecomunicações com a intenção de lança-la no mercado externo, dentro do Brasil, essa nova empresa poderá enfrentar uma série de problemas regulatórios em função dos inúmeros planos e regulamentos que o órgão deverá apresentar à curto, médio e longo prazos.

Na visão de Matarazzo, se o cronograma da Anatel for mantido, essas medidas tornam impossível uma competição da "Broi" com outros grupos estrangeiros. "Eu defendo que a Anatel deveria atuar para corrigir. Atuar para prevenir é muito complicado. Lá fora, a tendência tem sido da correção dos problemas. Não o da prevenção", ressaltou.

"Se você atua no sentido de criar regras preventivas, você pode acabar impedindo ou inibindo que certos benefícios possam ser criados", avaliou. Depois de Brasília, a Anatel ainda pretende realizar mais duas audiências públicas nos Estados de São Paulo (dia 07 de julho) e em Pernambuco (dia 14).



Nenhum comentário: