Os auditores do TCU comprovaram que há fortes indícios que corroboram as denúncias feitas pelo deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), durante a realização da CPI das Sanguessugas no Congresso, de que o esquema de compra superfaturada de ambulâncias no Ministério da Saúde, também tinha um paralelo aplicado na compra de unidades móveis de inclusão digital pelos Ministérios da Ciência e Tecnologia, na Finep - Financiadora de Estudos e Projetos, na Caixa Econômica Federal e no Ministério das Comunicações.
O esquema não foi investigado pela CPI. O PSB ameaçou processar o deputado carioca, assim como, o ex-secretário de Inclusão Digital do Ministério da Ciência e Tecnologia, Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), atualmente deputado federal por Brasília, e integrante da Comissão de Ciência e Tecnologia da Cãmara dos Deputados.
Segundo os auditores do TCU, diversos convênios (números 523.864, 534.051, 527.350 e 525.879) firmados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) com os municípios para aquisição de unidades móveis de informática, trouxeram prejuízo aos cofres públicos, uma vez que saiu muito mais caro a compra de veículos do que a instalação dos telecentros, com o mesmo objetivo.
Segundo os auditores, o preço médio pelas proposições dos interessados para implantação de uma versão escola móvel - composta de um micro-ônibus e sete estações de trabalho - situa-se em aproximadamente R$ 280 mil. Já no caso da implantação de unidades fixas, como por exemplo, o aparelhamento de 22 bibliotecas públicas do Distrito Federal, o MCT despendeu aproximadamente R$ 50 mil para abrigar 19 estações de trabalho.
Desperdício
"Conclui-se, por conseguinte que uma unidade móvel sediada em micro-ônibus, com sete estações de trabalho, custa quase seis vezes mais que uma unidade fixa, com 19 estações de trabalho. Todavia, não constaram justificativas que pudessem comprovar que os gastos com as unidades móveis eram mais vantajosos do que a implantação de telecentros fixos", informaram os técnicos do TCU.
O Ministério das Comunicações, por sua vez, assinou o convênio n.º 522.242, com a Fundação Assis Gurgacz, sem apresentar uma análise fundamentada sobre a economicidade da utilização de unidades móveis estimadas, cada uma, em R$ 253,6 mil. Esse convênio gerou um gasto de R$ 1,014 milhão.
"Mesmo que se argumentasse que, de fato, as unidades móveis seriam necessárias para atender a população do interior e de zonas rurais, ainda assim, seria necessário demonstrar que o quantitativo solicitado foi adequado. Não consta do processo o quantitativo de pessoas das áreas rurais a serem atendidas, nem a correlação desse quantitativo com a necessidade de adquirir quatro unidades móveis", esclarecem os auditores.
Os órgãos também não tiveram a preocupação em um número expressivo dos convênios de avaliar, informa ainda o relatório, a qualificação técnica e as condições (administrativa, técnica, operacional, experiência, pessoal qualificado etc.) das entidades convenentes para consecução dos projetos.
Licitações
Alem de inexplicáveis do posto de vista do custo/benefício, a compra dessas unidades móveis e outras celebrações de contratos aparentaram suspeitas de fraudes para os auditores do TCU. "A consolidação dos diversos achados constantes dos relatórios de auditoria das unidades regionais apontam para a ocorrência recorrente de vícios nos procedimentos de licitação e(ou) contratação direta promovidos pelos órgãos/entidades beneficiários dos recursos públicos federais repassados no âmbito dos programas de inclusão digital", informam os auditores.
Por conta disso, eles constataram que em diversos casos, houve ocorrência de pagamentos por serviços/bens a preços, acima dos praticados no mercado, em 48% dos convênios auditados.
Apesar de todas as normas previstas pela Secretaria do Tesouro Naciona, TCU e da Lei de Licitações, gestores públicos passaram por cima das mesmas para beneficiarem conveniados.
"Menciona-se, a título ilustrativo, o caso do convênio firmado entre o Ministério das Comunicações e a Fundação Assis Gurgacz (Convênio Siafi n.º 522.242), por intermédio do qual foram realizadas licitações na modalidade convite em valores muito superiores ao permitido para essa modalidade. Foram comprados por "carta-convite" quatro ônibus usados, por R$ 1.008.000,00, quando o limite previsto na Lei n.º 8.666/93 para tal modalidade é de R$ 80.000,00".
Para os auditores, isso demonstra "indícios de procedimentos fraudulentos na condução do processo licitatório, que indicam a possibilidade de licitação montada".
No Paraná, por exemplo, os ônibus usados no âmbito do convênio já eram de propriedade de outras empresas do mesmo grupo da Fundação Assis Gurgacz (a Eucatur e a Viação Nova Integração).
"A equipe do Paraná verificou que o indício de direcionamento da licitação também fica explícito pela descrição dos veículos no edital como ano/modelo 1996 e pelo prazo de entrega oferecido pela vencedora do processo, 10 dias, prazo impossível, em condições normais, em virtude das adaptações exigidas para transformar um ônibus urbano usado em veículo-laboratório de informática".
Outro exemplo característico é do termo de parceria firmado entre o Ministério da Ciência e Tecnologia e a ONG "Sercap", no qual se constatou a realização de licitação na modalidade convite, quando a modalidade adequada seria a tomada de preços.
Em Pernambuco, a ONG considerou como o valor máximo (R$ 300.000,00) para efeito de convite (modalidade que admite publicidade menos abrangente), quando a forma de contratação correta seria a Tomada de Preços. Quantia quase quatro vezes maior que a prevista pela Lei n.º 8.666/93, que é de R$ 80.000,00.
"Nesse sentido, destaca-se que a equipe de auditoria também apontou a existência de indícios de procedimentos fraudulentos na condução do processo licitatório, que indicam possível ocorrência de direcionamento da licitação ou licitação montada".
Outra inconsistência cronológica se observou, pelo fato de a certidão de regularidade fiscal da empresa vencedora, emitida pela Sefaz/PE, enviada quando da suposta "habilitação", realizada em 20/12/2005, ter data de emissão de 29/12/2005.
Superfaturamento
Numa análise, em 25 convênios firmados entre órgãos estaduais e municipais por intermédio de ONGs e os ministérios, pelo menos dez apontaram "vícios no processo licitatório", o que representa 40% do número total de convênios. Fartos exemplos foram dados pelos auditores do TCU.
"Ainda, não se deve deixar de citar, como casos emblemáticos de contratação direta em desacordo com a legislação, os ocorridos em municípios de Pernambuco que efetuaram contratações, sem licitação, da empresa KM Empreendimentos Ltda para aquisição de unidades móveis de informática".
Os técnicos do TCU evitaram comentar o assunto no relatório, mas este caso, em específico, foi objeto de denúncias do deputado Fernando Gabeira, na CPI das Sanguessugas. O caso não foi investigado pela CPI e Gabeira acabou sofrendo processos do PSB, do atual deputado Rodrigo Rollemberg, que na época das contratações era o secretário de Inclusão Digital do MCT. Rolemberg, inclusive, perdeu o cargo na época em que o escândalo estourou na CPI, pelo ministro Sérgio Rezende.
Para os técnicos do TCU ficou evidenciado que a empresa KM apresentava declaração de exclusividade registrada na junta comercial de Pernambuco com o intuito de firmar os contratos com as prefeituras municipais por inexigibilidade de licitação.
"Entretanto, conforme apontado pela equipe de fiscalização, trata-se, meramente, de declaração da Guararapes Equipamentos Rodoviários Ltda., arquivada na Junta Comercial do Estado de Pernambuco - Jucepe, onde consta como única autorizada a comercializar seus produtos em todo território nacional, distribuidor exclusivo para todo o Brasil".
De acordo com as informações que constam no Relatório de Auditoria, tal exclusividade limita-se aos veículos especiais fabricados pela Guararapes Equipamentos Rodoviários, só que existem no País diversas empresas atuantes neste setor, o que pode ser constatado em consultas a sítios na internet.
"No caso da Prefeitura Municipal de Exú/PE, a equipe propôs audiências, em especial quanto ao beneficiamento da empresa KM Empreendimentos Ltda, mediante autuação de processo de licitação ilicitamente frustrado, com fraude à legislação, e desviado para processo de inexigibilidade de procedimento".
E os auditores concluíram ainda que: "A mesma contratação por inexigibilidade também foi constatada nos convênios firmados com as Prefeituras Municipais de Cabo de Santo Agostinho/PE e Paulista/PE, indicando que, possivelmente, a fraude é sistemática em municípios pernambucanos".
A contratação direta, nestes casos, também, fica agravada pela constatação de que os preços contratados não eram compatíveis com o mercado. No caso da Prefeitura de Paulista, foi apontado o valor de R$ 315,1 mil, acima da média de mercado. Em Cabo de Santo Agostinho, foi calculado um prejuízo de R$ 100,2 mil, e em Exu, de R$ 46, 4 mil.
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